Saturday, January 28, 2012

coisas pequenas e frágeis

Hoje eu estava pensando sobre muitas coisas. Coisas pequenas e frágeis que cabem na mão e se partem quando apertadas, e coisas grande que podem mudar minha vida. E talvez a de outras pessoas, se elas se deixassem mudar.

Como o trabalho de pintar uma casca de ovo vazia com cera derretida, usando um pedaço de arame (um clip de papel desdobrado?). Vale a pena pintar uma casca de ovo? Tem gente que olha para o mesmo ovo (um ovo de verdade, cujo interior foi esvaziado por um buraco mínimo, de uns um ou dois milímetros de diametro) e não vê nada de valor, não vê nenhuma arte. Joga-o no fundo de uma gaveta junto com papéis abandonados, coisas que já não são mais usadas, e o deixa lá, ignorando sua fragilidade, sua beleza, sua arte.

Uma casca de ovo, que coisa pequena, que coisa mais fútil e sem valor. Mas um quadro de Rembrant também é só um pedaço de pano esticado por cima de uma armação de madeira barata. Quem me ensinou a olhar para um quadro e ver beleza nele? Quem me ensinou a olhar para um ovo pintado e admirar a mão precisa daquele que o pintou? Acho que há coisas que não se ensina.

Uma parte do meu cerebro me diz pra olhar para arte e aprecia-la. Apreciar que tem alguém, que eu não conheço, que fez algo com o qual eu me identifico de alguma forma, que fez algo que me faz sentir sentimentos tão fortes que é como se minha vida houvesse sido abalada de alguma forma. Que me faz rir ou me faz chorar, que me faz seguir cada traçado por horas, obsecada.

4 comments:

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  2. E ainda assim, mesmo depois do que falamos hoje mais cedo, algumas pessoas não conseguem mais se relacionar com Bach da mesma forma que outras não alcançam Schoenberg plenamente. Acho que a resposta pode ser mais uma linguagem e menos uma ignorância. Barthes tem um capítulo muito bom em O Grau Zero da Escrita em que ele fala de como uma criação estética (literária, neste caso) se firma sobre um conjunto de palavras "permitidas", "desejáveis", em um conjunto limitado de possibilidades que não só re-afirmam uma ideologia (a ideologia burguesa no século XIX, por exemplo) como também repetem (obsessivamente?) um molde já conhecido. Bach está longe no tempo. Schoenberg talvez esteja longe no espaço. A imortalidade deles, assim como a de qualquer artista, depende de que o leitor/espectador compactue (e possa compactuar) com uma linguagem que pode já não ser mais a dele. Em alguns casos a viagem é possível, ou parcialmente possível. Às vezes a única viagem possível está numa re-leitura moderna, numa atualização de um conteúdo que não parece, mas que já foi perdido. No caso das cascas de ovos do leste europeu, talvez elas estejam longe não do espaço ou do tempo, mas da própria realidade das pessoas que nunca viram nem nunca saberia vê-las. É triste pensar assim, e isto não pretende ser um julgamento, mas algumas coisas simplesmente não vão significar nada para determinadas pessoas.

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  3. enfim, acho que a questão que eu quiz abordar é que independente da distância da linguagem da arte clássica e do populacho de hoje em dia, poucas pessoas (ao meu ver) dão "ligancia" pra coisas como arte. Quase ninguém mais lê, muito menos leem (olha, escrevi sem o acento) poesia, quase ninguém vai a museos, aprecia arte como arte ou como algo que enriquece a vida. Pensando bem, as únicas artes que vêm se dando bem nos dias de hoje são o cinema e a moda. A moda porque ninguém anda nú e o cinema porque talvez seja a forma de arte mais fácil de digerir. E mesmo assim, os filmes de cinema-arte são bem obscurecidos, apenas os filmes comerciais vendem bem.

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  4. Eu me pergunto se em algum momento as pessoas, como um todo, já foram realmente frequentadoras contumazes de museus ou se apenas não tinham mais o que fazer. Mike Deodato (desenhista de quadrinhos) é bem feliz quando comenta que muito dos quadrinhos perdeu força quando surgiram os desenhos animados de super heróis e os filmes de super heróis, ou mesmo os video games. Outras mídias carreiam os conteúdos de uma forma mais apelativa para uma certa maioria. Quem lê Shakespeare quando pode ir a uma peça de Shakespeare? Quem vai a uma peça quando pode ver um filme? Quem vê um filme obscuro quando pode ver um outro filme que é, na verdade, uma versão adaptada e modernizada de Shakespeare, com carros e explosões e atores americanos teen super pops? O frequentador de teatro não se vê ameaçado, eu acho, pois não foi ele quem saiu do lugar, mas tem razões para se sentir um pouco mais só, e mais ainda para se preocupar com quem vai financiar a arte que ele curte uma vez por semana, ou uma vez por mês. Sem plateia a coisa não se sustenta. O mesmo para o leitor de poesia, embora seja menos ameaçado (ele tem a história inteira da língua escrita pra ler antes de perceber que não escrevem mais poesia com a frequência antigamente. Mas será que se escrevia tão mais poesia assim no passado?). Os livros sobrevivem de uma maneira diferente que há cem anos. Os livros são outros. O público é outro, a cultura é outra (cultura de best seller?). Há cem anos o best seller não existia, não como existe hoje (ou, melhor, surgia e desaparecia intermitentemente desde o começo do século XX). E o que é esse formato mesmo? O leitor americano lê mais que o brasileiro, e o novaiorquino padrão lê vinte vezes mais que o brasileiro e dez vezes mais que o argentino, mas o que é que ele está lendo? Toda vez que vou a uma banquinha de jornais americana eu estranho os livros que eles vendem, pois, supostamente, aqueles são os livros mais populares, os que vendem. Eu me sinto alheio àquilo. Socorro.

    Acho que os produtos para consumo em massa sempre existiram, mas ganharam novas mídias, fizeram modas e caíram da moda. Outras modas surgiram. Shakespeare, Mozart e Hitchcock não eram cult. Eles eram os caras mais pops e comerciais do mundo na época deles, mas a cultura também era outra. Quando paro para pensar nisto eu não me esbarro tanto com uma mídia, mas, novamente, com uma linguagem, algumas delas, na verdade, e apesar de achar que esta linguagem de hoje é mais pobre, ela comunica melhor, com mais eficiência pelo menos, mas comunica melhor o quê? E comunica melhor pra quem? Esta pode ser uma forma de se aproximar dos sintomas de toda uma época, de um momento importante para os mecanismos ideológicos que falam sobre um período histórico inteiro, quando mulheres de trinta anos (que um dia já foram chamadas de balzaquianas) passaram a se comportar como adolescentes de treze, e desejaram fantasiosamente terem casos de amor com cadáveres impúberes, brilhantes e mórmons. Sintoma de um tempo: as meyerianas. Será que cola?

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